Ecologia Urbana: Interação Sociedade – Natureza, “Um campo novo derivado da Ecologia tradicional”
Artigo retirado da revista SEAERJ Hoje, nº 23 (julho de 2014), páginas 24 a 27.
Decorridos 14 anos do novo milênio, persistem os desafios de encontrar novas perspectivas para os centros urbanos, com o propósito de viabilizar a sua existência. Um novo ramo da ecologia tradicional se apresenta como o caminho para entender os sistemas naturais dentro das áreas urbanas (cidade), e as relações humanas com os mesmos.
A palavra Ecologia tem origem na cultura grega e é composta por dois vocábulos: “oikos”, que significa casa, e “logos” que significa estudo. Logo, por extensão, seria o estudo da casa, ou de forma mais genérica, do lugar onde se vive. Foi o cientista alemão Ernst Haeckel, em 1869, quem primeiro usou este termo para designar o estudo das relações entre os seres vivos e o ambiente em que vivem.
A Ecologia Urbana, é um campo novo derivado da Ecologia tradicional que tem como objetivo, estudar o ambiente e os sistemas naturais dentro das áreas urbanas, avaliando as relações entre seres humanos, animais e plantas.
O modelo de produção e consumo dos seres humanos, suas relações com o meio ambiente local e externo é a componente mais importante da Ecologia Urbana, e de seu êxito, depende a melhoria da qualidade de vida ambiental das atuais e futuras gerações.
A descrição das formas de ocupação e apropriação do espaço em meio urbano foi na origem, promovida pela chamada escola de Chicago, aplicando os princípios da ecologia vegetal e animal às comunidades humanas.
“Aglomerações intensificam as pressões sobre o meio ambiente”.
Ecologistas urbanos estudam árvores, rios, vida selvagem e áreas livres encontrados nas cidades, para entender até que ponto esses recursos são afetados pela poluição, urbanização e outras formas de pressão. Essa tarefa pode contribuir para ajudar as pessoas a verem as cidades como parte de um ecossistema vivo.
O maior obstáculo a ser enfrentado pela Ecologia Urbana no Brasil, é que, 80%, da população brasileira já se aglutinam em núcleos urbanos, formando cidades.
Em 1970, a população brasileira somava 90 milhões de pessoas. Hoje, 44 anos depois, já ultrapassa os 200 milhões de habitantes. Além disso, a impermeabilização do solo, a poluição dos cursos d’água, a poluição do ar, a ocupação das encostas, o desmatamento, além da supressão de animais silvestres, constituem o elenco de degradação, em grade parte provocado por essa explosiva evolução populacional e os desmandos quanto ao uso e ocupação do solo urbano.
Numa segunda escala, estão os problemas da distribuição de água, geração excessiva e a consequente deposição de resíduos sólidos e as demandas por energia, habitação e transporte. O aquecimento atmosférico, em grande parte, é consequência da emissão de gases do efeito estufa da frota de veículos urbanos. Essa frota por conseguinte, dificulta também, a circulação nas gerando a já conhecida crise da mobilidade urbana.
Em função do adensamento populacional e do uso indiscriminado do solo nas cidades, atividades de produção rural e industrial, para atender a demanda diária dos citadinos, normalmente acontecem na periferia dos centros urbanos. Para que os produtos (hortifrutigranjeiros, bebidas, cereais entre outros), cheguem diariamente à mesa dos moradores, há necessidade de distribuição rotineira, demandando veículos de carga, de pequeno, médio e grande porte que, por sua vez, necessitam de vias arteriais de médio e grande porte, além de estacionamento adjacente às ocupações e aos edifícios comerciais.
Essas aglomerações ora formais, ora informais, intensificam as pressões sobre o meio ambiente gerando impactos, exigindo cada vez mais, aplicação de recursos para a conservação ambiental e a promoção da tão desejada sustentabilidade.
E o que é viver de forma sustentável? É proteger a estrutura, as funções e a diversidade dos sistemas naturais do Planeta Terra, mesmo baseado no sistema econômico centrado no desenvolvimento, cujos benefícios não têm sido distribuídos equanimemente. Só a garantia de acesso à saúde, educação, moradia, alimenta- ção, segurança e prática política, para todos, representa desenvolvimento verdadeiro e garante vida saudável e duradoura para as pessoas, além da conservação do Planeta para as atuais e futuras gerações.
A Ecologia Urbana, baseada nos conceitos da Ecologia tradicional, para que possa cumprir seu papel, quanto norteadora das soluções para os problemas das relações entre a sociedade e a natureza, necessita dialogar com as áreas das ciências sociais, como a Antropologia, a Sociologia, a Geografia, a Arquitetura e Urbanismo e a Engenharia, entre outras.
Deve fazer parte, preliminarmente, do diagnóstico das necessidades de um núcleo urbano (cidade), atendendo as orientações metodológicas da Ecologia Urbana, a quantificação da “Pegada Ecológica” – área que uma pessoa precisa para sustentar o seu consumo e absorver seus resíduos pelo período de um ano (ha/pessoa/ano) – Genebaldo Freire Dias – Ecopercepção- 2004. De posse desse dado, será possível estabelecer critérios de planejamento e sustentabilidade para a sociedade local.
“No caso da água, é necessário campanha de esclarecimento”.
A “Pegada Ecológica” de uma pessoa ou população depende de seus padrões de consumo. Atualmente, cada habitante do Planeta Terra tem apenas 1,6 hectares (16.000 m²) de terras ocoprodutivas disponíveis ao ano (na década de 1960 era 6,3 hectares, 63.000 m²).
Esse deveria ser o valor máximo da “Pegada Ecológica” para cada habitante do planeta. Entretanto, os países mais industrializados têm uma “Pegada Ecológica” superior a 6 ha/pessoa/ano, gerando vários déficits globais.
Após a definição da “Pegada Ecológica”, são necessários estudos, diagnósticos, quantificação e avaliações quanto aos recursos naturais (solo, água, floresta), existentes nos ambientes a serem estudados, sua capacidade de atendimento das demandas, bem como sua conservação para as gerações futuras.
Para que possamos entrar, definitivamente, numa nova lógica de interação entre sociedade e natureza, devemos interromper o modelo de crescimento baseado unicamente nas pessoas, passando a praticar um desenvolvimento que inclua a prática da conservação da Natureza. Desenvolvimento e conservação não são antagônicos; são na verdade, complementares e indispensáveis.
Devemos cuidar da natureza, não pelo fato de ela ser essencial para satisfazer as necessidades humanas, mas pelo simples fato de os componentes que dela fazem parte terem o mesmo direito à vida e à conservação que os seres humanos. Outro aspecto que precisamos observar é a necessidade de tornar as cidades mais sustentáveis e menos dependentes de recursos externos.
Uma das primeiras ações nesse sentido é estimular o “cooperativismo”, atitude que estimula a população no sentido da utilização compartilhada dos recursos naturais e da infraestrutura de energia, transporte.
No caso do recurso natural água, é necessário a formatação de uma campanha de esclarecimento quanto a racionalização de seu uso para evitar o desperdício. Além disso, devemos proceder a ré- naturalização dos cursos d’água e a devida proteção de suas nascentes.
No caso particular do Rio de Janeiro, temos o exemplo histórico do reflorestamento da Floresta da Tijuca, que tem início já em 1848 com o plantio de árvores em terras particulares. Com a conscientização da população quanto ao agravamento do problema do abastecimento de água na cidade, e com os mais variados estudos e buscas de alternativas para resolver o problema, é nomeado, em 1861, por D. Pedro II, o Major Manoel Gomes Archer Administrador da Floresta da Tijuca.
O desafio a ele imposto, era implantar um programa de recuperação da floresta com o replantio de árvores e arbustos, para conservar as nascentes dos rios e garantir o fornecimento de água para a cidade.
“Devemos também maximizar o uso do transporte coletivo”.
A metodologia utilizada por Archer diferia das já conhecidas, pois, utilizava mudas desenvolvidas ao invés de sementes.
A umidade ainda existe e o acúmulo da deposição de matéria orgânica morta, em diferentes fases da decomposição de animais e vegetais formava a “serrapilheira”, fundamental camada da adubo riquíssima em matéria orgânica. O indivíduo recém plantado, raramente feneceria; esse trabalho consagrou o Brasil como o primeiro País a implantar a Silvicultura (Ciência dedicada ao estudo dos métodos naturais e artificiais de regenerar e melhorar florestas).
Podemos considerar o caso da Floresta da Tijuca, um caso particular de Ecologia Urbana (precoce) onde as fases dessa nova disciplina claramente se apresentam:
- Relação entre sociedade e natureza local, na supressão da floresta nativa e exploração do recurso natural solo, para plantio de cana de açúcar e café;
- Degradação das nascentes e cursos d’ água da Floresta gerando o desabastecimento da cidade;
- Quantificação do número de dependentes do abastecimento de água da Floresta;
- Estudos e propostas para reverter o desabastecimento;
- Implantação de programa plantio de árvores em áreas particulares;
- Desapropriação das propriedades plantadoras de cana de açúcar e café;
- Implantação de programa de reflorestamento liderado pelo Major Manoel Gomes Archer, que após 13 anos do projeto sob sua liderança, já havia plantado mais de 100 (cem mil) árvores.
Devemos também maximizar o uso do transporte coletivo urbano sustentável, em oposição ao tradicional “modelo rodoviarista” que prioriza o transporte individual, requer ampliação constante da malha viária, além de estacionamento. Incentivar o uso de bicicletas, ampliando a malha cicloviária e implantando bicicletários.
Criar nas escolas públicas e privadas, programas de divulgação da importância da floresta loca,l no caso do Rio de Janeiro a Floresta da Tijuca, e seu papel na amenização da temperatura ambiente da cidade, manutenção de nascentes de rios urbanos, incentivando sempre o reflorestamento, ao invés do desmatamento, conservando sempre as áreas verdes.
Com relação ao consumo, incentivar a adoção da regra dos 3 “R”: Redução, Reutilização e Reciclagem dos resíduos.