Pneumologista Dr. Hermano Castro explica o panorama atual da Covid-19
Durante a 16ª reunião do Conselho Diretor da Seaerj, o pneumologista e diretor da ENSP (Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca – Brasil), vinculada à Fiocruz, explicou como o Sars Cov 2 vem mudando a realidade no Brasil e no mundo. Ele estabeleceu um panorama cronológico e mostrou como a Fiocruz tem agido diante da pandemia.
Hermano afirmou que, certamente, o efeito da pandemia no Brasil seria devastador se não houvesse o SUS (Sistema Único de Saúde), ressaltando o registro de mais de 151 mil mortos até aquele momento.
A linha cronológica apresentada apontou o início em dezembro de 2019 em Wuhan, na China, com as primeiras notícias sobre a doença viral com alto contágio e, até então, com letalidade relativamente baixa. O vírus da família Corona já era conhecido pelos especialistas, no entanto houve uma variação sem imunidade humana: o SARS-CoV-2. Sem tratamento, a única medida preventiva foi o distanciamento social. Logo no início da pandemia na China, a Fiocruz recebeu as informações de tipagem do vírus e, poucos dias depois, já tinha os kits de identificação do vírus.
O primeiro caso no Brasil foi registrado no dia 26 de fevereiro de 2020. O vírus chegou ao Brasil pelos aeroportos, pelo trânsito entre países. Diante disso, a Fiocruz produziu kits de diagnóstico em larga escala. Os testes disponíveis para identificação de Covid são o sorológico, em que se identifica o anticorpo, o teste rápido e o PCR (proteína C-reativa), que é o teste que o especialista indica como o mais eficaz. Segundo o especialista, o teste PCR é o mais certeiro. “Ainda existem muitas dúvidas sobre a doença, e reações cruzadas podem apontar resultados falsos em alguns casos”, explicou.
O palestrante também explanou um paralelo entre o Brasil e o mundo. Um dado curioso é que o Brasil possui menos casos que a Índia, no entanto, tem mais mortes. Em segundo lugar no número de mortes, o Brasil perde apenas Estados Unidos.
Quanto a avaliação dos picos, os EUA registram uma curva com dois picos no início da pandemia, depois abaixam e logo crescem novamente ficando estáveis para cima. No Brasil, o isolamento social apontou resultados positivos no mês de março e evitou um número ainda mais elevado de mortes. Em seguida, a discussão economia versus vida virou tópico causando uma redução drástica na porcentagem de pessoas em isolamento social. Os números ideais para isolamento eram na casa dos 70%, o Brasil chegou a 50%. Colocando em números, a taxa de contágio fica em torno de 1%, o que significa que a cada 1000 pessoas 100 são contaminadas. O ideal seria 0,5%.
No mês de julho, o vírus chegou ao interior do país atingindo locais com condições mais precárias no serviço público de saúde. De acordo com Hermano, alguns estados conseguem estabilidade e outros ficam no “vai e vem”, ou seja, o pico melhora e depois volta a piorar. O Rio de Janeiro está entre esses estados.
Uma grande questão levantada pelo palestrante é a desigualdade social presente na pandemia. As regiões com mais casos não são as com maior número de mortes. Ele cita o exemplo do Rio, em que na Barra da Tijuca e zona sul registram o maior número de casos, mas não acompanham o maior número de mortes da cidade. Isso porque existe uma diferença no acesso a unidades de saúde bem equipadas. O padrão no Rio nunca chegou ao nível aceitável. Em números reais, 10 casos diários estariam dentro do esperado. Porém, o que acontece são registros de 300 novos casos diariamente com internações e mortes. Com o maior pico no mês de maio, se o Rio fosse um país teria a maior taxa de mortalidade, e as mortes continuam crescendo comparado a outros países.
No decorrer da pandemia, os hospitais de campanha não foram todos concretizados e a quantidade de equipamentos e profissionais não foi suficiente. Já na rede privada de saúde, a situação foi encarada de forma diferente com investimentos claramente discrepantes.
Os brasileiros que dependem do serviço público viram a corrupção dos governos escancarando os problemas de acesso e incentivo. Diante da pandemia houveram desvios da saúde, impeachment de governador e episódios que trouxeram imensos prejuízos ao combate à Covid.
No início do mês de maio a Fiocruz publicou um documento afirmando que o Rio de Janeiro precisava de lockdown. Se a medida fosse cumprida teria levado as taxas a níveis mais aceitáveis, mas exatamente o contrário foi feito. As atividades foram retomadas gradativamente e elevaram mais ainda os níveis de casos e mortes.
Hermano citou também alguns indicadores de avaliação de novos casos. No entanto, alertou a falta de testagem e de vigilância. Outro fator importante citado pelo palestrante foi a orientação da OMS (Organização Mundial da Saúde) no início da pandemia de que pessoas com sintomas leves deveriam evitar a procura por serviços médicos. No entanto, o pneumologista afirma que todos os casos requerem a medição do nível de oxigênio.
A orientação levou as pessoas que ficaram em casa a uma pneumonia silenciosa, só se identificada com oxímetro. Um projeto realizado na Fiocruz idealiza o uso dos oxímetros e acompanhamento nos ambulatórios para identificação dos sintomas graves com antecedência e promover o tratamento necessário, o que pode evitar muitas mortes.
O último assunto abordado por Hermano foram as vacinas em desenvolvimento o que representa uma uma luz no fim do túnel, mas não uma solução definitiva. O médico alertou que não existe previsão de vacina pra esse ano e explicou que a Fiocruz tem uma plataforma em desenvolvimento para elaboração da possível vacina.
“Se comprovada a eficácia temos estrutura para iniciar a produção. Os esforços do mundo estão voltados para essa causa com muitos profissionais competentes dedicados a isso”, pontuou. Hermano explicou ainda que o tempo de produção está sendo encurtado diante da urgência, mas nenhuma vacina será implementada sem eficácia comprovada. Ele deixou claro que a Fiocruz está diretamente envolvida e tem total capacidade de produção. Para ele até o meio do ano do próximo ano (2021) a projeção é de que metade da população tenha acesso a vacina pelo SUS.
Ainda finalizando a palestra, Hermano respondeu algumas perguntas dos participantes e agradeceu o convite. A reunião seguiu comandada pelo presidente Alberto Balassiano.
Veja a palestra na íntegra: https://www.facebook.com/Seaerj/videos/1829511113875685