Nota da Seaerj sobre as obras de uma tirolesa e notícia de outras no morro do Pão de Açúcar e da Urca
A Sociedade dos Engenheiros e Arquitetos do Estado do Rio de Janeiro (SEAERJ) congrega profissionais Engenheiros, Arquitetos, Engenheiros Agrônomos, Engenheiros Químicos, Geólogos e Geógrafos, servidores ativos e inativos do Rio de Janeiro e de seus Municípios e existe desde 1935.
Seu estatuto preconiza, dentre outros objetivos, a colaboração com a Administração Pública, em todos os seus órgãos, visando gerais melhorias para a população. Nesse sentido, a defesa da ampla proteção de bens tombados e ambientais é um imperativo, eis que pertencem a toda sociedade brasileira e mundial.
Ao tomar conhecimento de obras de instalação de uma tirolesa no Morros do Pão de Açúcar e da Urca, que vem gerando clamor público na sociedade carioca, com repercussão internacional, a SEAERJ realizou, no dia 29 de março de 2023, uma mesa de debates sobre a questão. Na ocasião foram ouvidas diversas personalidades, entre elas, arquitetos, juristas, ambientalistas, montanhistas, gestores públicos, associações de moradores, objetivando esclarecer melhor o tema que envolve: obras em andamento, desmonte de rochas e pretensão de expansão edilícia das atividades ali concedidas pela União Federal, temas que muitos de seus associados têm profundo interesse e expertise.
Após o citado debate e considerando a relevância ambiental, nas questões geomorfológica e paisagística dos bens tombados que compõem o conjunto dos Morros do Pão de Açúcar e da Urca e todo arcabouço legal sobre eles incidente, a diretoria da SEAERJ decidiu emitir a presente nota, também baseada no cômputo de suas competências estatutárias e sempre visando o aperfeiçoamento das ações da Administração Pública, que integra (e integrou) através de muitos de seus associados.
A cidade de Rio de Janeiro tem na sua paisagem um de seus maiores ativos, consagrada até mesmo no Plano Diretor da Cidade. Um dos símbolos aéreos mais significativos é o conjunto dos Morros Pão de Açúcar e Urca, uma marca registrada da cidade reconhecida em todo o planeta. Por isso esse conjunto foi tombado pelo IPHAN em 1973 e tornado uma unidade de conservação municipal (UC) de proteção integral da categoria Monumento Natural (MoNa) em 2006. O próprio nome já é indicativo de proteção. Os morros também são considerados monumentos geológicos por entidades internacionais.
Por conseguinte, sugerimos que o poder público reavalie a concessão de autorizações ou licenças para a instalação da citada tirolesa, considerando:
1) a legislação urbanística da cidade, através do Decreto de Zoneamento nº 322/1976 – hoje com força de Lei Complementar – consagra em seu artigo 163 a chamada Zona Especial 1 – ZE1 que compreende áreas acima da cota 60, consideradas como reserva florestal, nos Morros Pão de Açúcar e Urca. A ZE-1 grava essas áreas como non aedificandi e determina que sua cobertura florestal seja preservada. Não obstante exista um plano de manejo para o local entendemos que deva ser aplicada ao caso a legislação mais restritiva, tendo em vista a multiplicidade de diplomas protetivos incidentes sobre aqueles morros e seu caráter de bens públicos de fruição de toda a sociedade;
2) as informações repassadas inicialmente para a municipalidade não esclareciam totalmente a necessidade de extração de cerca de 160 m3 de rocha de um bem tombado, unidade de conservação municipal de proteção integral situada em majestoso e imponente rochedo de quase 400 m de altura, o que gerou o embargo essas obras;
3) os possíveis impactos ambientais sobre o MoNA Pão de Açúcar e sua zona de amortecimento em razão da forte atratividade exercida pela atividade ora autorizada, somados às outras ampliações noticiadas e/ou pretendidas podem superar a capacidade de suporte/carga daquela unidade de conservação, tanto nos seus aspectos bióticos quanto abióticos;
4) os possíveis impactos de vizinhança no bairro da Urca, em função de suas características urbanísticas únicas, que o tornam bastante vulnerável – mormente no aspecto da circulação viária – com o objetivo de proteger sua ambiência e a qualidade de vida de seus moradores;
Opinamos também que quaisquer intervenções nesse símbolo emblemático da cidade sejam limitadas a modernização e manutenção das instalações ora existentes, eis que ocupam provisoriamente áreas públicas visivelmente delicadas – e por isso mesmo legalmente protegidas – topos de morro onde ainda vicejam e se abrigam flora e fauna local e migratória. Obras em rocha nesse local devem se limitar a contenções geológico-geotécnicas estritamente necessárias e que utilizem o estado da arte em termos de mimetização e integração com a paisagem.
Muito embora sejam pontos turísticos de grande atratividade, o maior objetivo do acesso e uso desses bens públicos é a fruição da fantástica e singular paisagem, conhecida mundialmente e também reconhecida pela UNESCO como Patrimônio Mundial. Nesse ponto menos é mais. A SEAERJ disponibiliza seus espaços para a continuidade desse e de outros debates que visem o pleno exercício da democracia, o aprimoramento e aproveitamento do lastro técnico-científico de seus associados e, principalmente, a defesa e preservação dos bens ambientais para as presentes e futuras gerações.
2 Comentários
Achei otima a Nota da SEAERJ. Simples, objetiva, t[sobretudo técnica , com boa abordagem do problema e boa listagem dos problemas que a obra acarreta e da legislação que fere, finalizando com um posicionamento efetivo bem definido e bem defendido. Parabens à SEAERJ.
Considero esse projeto descabido e destrutivo. Que seja embargado já!